sábado, 11 de julho de 2009

O fim final




Abrir os olhos de manhã parece bem difícil para alguns. Para João, no entanto, difícil era fechar os olhos à noite. Insônia não era um mal que lhe afligia. O que o impedia de pregar os olhos era apenas o medo.

Quando criança ele tinha medo de que os pais morressem. Acordava depois de pesadelos horríveis nos quais os pais sofriam todo tipo de colapso, acidentes aéreos, cortes na garganta, tiros e facadas... Joãozinho cresceu um pouco e aprendeu que seus pais são praticamente super-heróis. Passou a considerar a morte deles algo inimaginável e, desde então, começou a temer outras coisas. Aos 12 anos temia não ser tão alto, aos 13 não ser tão magro, aos 14 não ser amado por Maria, aos 15 amar Pedro, aos 16 não ter aquilo avantajado, aos 17 não conseguir sair da escola, aos 18 não entrar na faculdade, aos 20 não conseguir emprego....

Não se pode negar que as fobias, por mais idiotas que sejam, motivam nossas vidas. No fundo, João queria ser alto, esbelto ter alguém pra chamar de amor, pra fazer amor, pra ser motivo de orgulho, para ganhar a confiança das pessoas com as quais ele convivia. Regras da sociedade....

Quando nascemos e nos tornamos crianças que têm ao seu lado dois super-heróis, acabamos por pensar que seremos protegidos por eles eternamente. O que ocorre, no entanto, é que, ao crescer, começamos a pensar que os heróis somos nós! Tememos não atingir os padrões necessários para que nós passemos a ser os heróis de alguém. João conseguiu uma pessoa pra dizer que o ama, pra lhe abraçar à noite na cama, para ama-lo e nem sempre respeita-lo afinal, como diria um poeta, “Ser fiel não é apenas não beijar, não tocar. Ser fiel é, na verdade, pensar em como a outra pessoa se sentiria se fosse um mosquitinho e estivesse ali do lado... assistindo a tudo, ouvindo tudo”.

O problema é que ao ser o herói de alguém, chega um momento em que você descobre que esse alguém pode ser um vilão. Amor não é sinônimo de fidelidade. Sofro com isso e continuo a amar e a perdoar.

Ainda quem não sofre com problemas sentimentais, como o João, aprende com a dor que nada dura para sempre. As amizades se esfriam com a distância e, aqueles que antes te confidenciavam a vida, sequer lhe olham a cara. Os amores lhe machucam. Quem diz não viver sem você vive no MSN com amores secretos que você finge não conhecer. E, por fim, os heróis da infância, aqueles que protegeram esse menino até quando ele recusava ou fingia ouvir seus conselhos, se vão. O resto da vida de João passou a ser, então uma busca incessante por alguém que lhe oferecesse algum tipo de amor verdadeiro até ser enterrado depois de uma cerimônia realizada por pessoas que a cada dia se lembrarão menos dele.

No fim, acabamos como o João: sem pai, sem mãe, sem amores que nos abracem de conchinha na última cama que ocuparemos a sete palmos. Não tenho medo da morte, tenho medo, de, assim como o João, morrer sem alguém que supra o cúmulo do egoísmo que me faz querer me sentir amado. Tenho medo de acabar sozinho!

A. Fernandes

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